Não sou, nem pretendo ser, pessoa ligada à política.
Continuo a acreditar que um verdadeiro político é alguém que sonhou uma sociedade melhor, e que quer verdadeiramente contribuir para que a sociedade onde se insere se aproxime o mais possível desse sonho.
Assim, defino um verdadeiro político como um criativo no sentido da capacidade de sonhar e igualmente criativo no sentido da capacidade de concretizar. Pela demora na apresentação destas linhas, pode bem concluir-se que não tenho vocação concretizadora, o que será inteiramente correcto, pelo que assumo o meu papel de ponderado eleitor, escolhendo dentro do que me é ofertado para a direcção do meu país, se não aqueles de cujas ideias mais me aproximo, pelo menos os que delas estão menos distantes nas questões mais relevantes, deixando a política entregue a melhores mãos.
E tudo estaria bem, e seria como deve ser, não fora nos últimos anos me ter apercebido dos imensos disparates a que os nossos eleitos se têm dedicado.
O pouco que sei de ciência política e de economia, obtive nestes últimos 3 anos, em artigos, áudio livros e vídeos de lições publicados para o grande público norte-americano, o que para além da previsível superficialidade, exige o seu sentido crítico e precaução. Na ausência de verdadeira discussão sobre as matérias, fica sempre a dúvida de ter servido para alguma coisa, para além de acalmar a violência do sentimento revolucionário que este governo vem cultivando em gente como eu.
Não espanta pois, que ao longo destes anos tenha assacado à oposição nacional as enormes responsabilidades, não só pela manutenção deste governo, mas também pelo modo como o deixa actuar, incólume e sereno. Se tem sido possível ver verdadeira oposição, ela tem frequentemente sido mais visível por parte de personalidades afectas aos partidos do governo do que propriamente por parte de quem foi mandatado para o fazer.
Não me creio só na frustração provocada por este estado de coisas. Nem nos sentimentos de impotência e injustiça. Já bastava vivermos num país onde a maior parte dos empregados é mais competente que os respectivos empregadores. Mas vivermos num país onde os governantes se curvam a todos menos à vontade dos seus próprios concidadãos, que tudo fazem para descriminar e separar, que mentem e enganam despudoradamente, mantendo cegamente a fé em processos e procedimentos comprovadamente catastróficos e fazendo uso indiscriminado de todos os meios ao dispor, rumo ao desastre social e económico, é definitivamente exasperante.
Ora pelo atrás descrito, verificando-se historicamente a impossibilidade, em Portugal, de uma governação estável e em coligação à esquerda, e pela necessidade de uma governação capaz de desfazer os disparates da direita, o maior partido da oposição assume capital importância. E deve assumir também a parte de leão das responsabilidades. Não pelo passado, que por ser recente ainda não tem a história consolidada, mas pelo presente, este que teima em arrastar-se para lá do razoável. E nesse presente muita coisa está a acontecer. Muita coisa lamentável.
Ao longo destes três anos votei PS. Votei em Sócrates porque percebi muito bem não só o jogo de Pedro Passos Coelho e do sistema bancário, como o dos restantes partidos. Nas autárquicas não havia como não votar PS para o município, afinal em Lisboa só António Costa, mas a decisão quanto ao conselho e freguesia provocaram aturada reflexão, dadas as tristes decisões do secretário-geral reflectidas nas listas a concurso na região. O capital de crédito que cedia ao PS estava a esgotar-se. No final, o que pesou foi o castigo ao governo. Por uma unha negra. Quanto às europeias, assisti à retirada de alguns dos melhores deputados europeus e à permanência e colocação de outros que enfim, nem vale a pena referir. Motivos políticos, creio. Porque votei então PS? Por dar ouvidos a sondagens e à restante oposição. Pretendia castigar tanto o governo, pelas acções, como o PS pela inacção, mas não queria castigar tanto que pudesse de alguma forma reforçar o governo. Com sondagens a dar uma grande subida do PCP e este a recusar diálogos com o PS, tive de me conformar.
Ao longo destes tês anos fui dando o desconto. Numa ou noutra intervenção de António José Seguro era capaz de pensar “Olha, parece que o homem vai atinar, desta vez portou-se à maneira!” para pouco depois ouvir outra intervenção a suscitar um instantâneo “Mas este bacano é burro?” e logo a seguir outra a trazer à mente um “Vê lá se te mexes homem, vai à luta ó minha alforreca coxa!”. E esta sensação de eleitor de bancada foi-se prolongando com impropérios progressivamente menos respeitosos e mais frequentes. Durante este tempo confortava-me a ideia de que eventualmente, António José Seguro assumiria o seu papel de lebre e apesar de ter blindado os estatutos do partido assim que o conquistou, acabaria por sair. A reacção de Seguro à primeira investida de Costa não o elevou na minha consideração, antes pelo contrário, até porque ali ficou patente o que faria Seguro para manter o poder; Mas o recuo de Costa desiludiu-me. Muito. Só me ocorria pensar: “E agora, levamos com o Coelho até ao fim?”
Se há diferença entre a urgência e a emergência é esta: é que a urgência se pode prolongar indefinidamente sem reacções aparentes de quem a pode resolver. O conformismo é mau conselheiro, mas que fazer contra um mau governo unido a um ainda pior presidente da república? A gente pode imaginar mil e uma peripécias e acredite-se, de muito fértil imaginação gozo, mas não encontrei maneira realista de despachar governo e presidente sem magoar seriamente alguém.
Na noite das europeias, de família em peso pendurada no televisor, assistimos incrédulos à entusiástica declaração de Assis e ao discurso de Seguro. Grande vitória! Em vez de um esperançoso “vamos trabalhar para que o próximo resultado seja decente”, observámos secretário e candidato satisfeitíssimos com trinta e poucos por cento de votos, porque afinal na europa havia sido pior! Meus senhores, os males dos outros não me confortam a mim! Eu quero que me digam quando é que tiramos Coelho e apaniguados do poleiro! Só isso. É pedir assim tanto? Há que parar a sede sanguinária do governo! E é já!
Finalmente avançando, António Costa demonstrou ter muito bom ouvido.
A esperança que trouxe deu-nos energia. Juro, saltei de contente e bati palmas! Não sou de grandes demonstrações de entusiasmo, mas demorou a voltar a esconder os dentes! “Ena pá cum caraças!” O ambiente em casa mudou de repente. Como quando o Gaspar basou e o Portas fez que basava. Mas melhor. Muito melhor.
Desgraçadamente, Seguro é Inseguro. E como tal, não se vê sem o tão almejado poleiro, mesmo tendo provado que não o merece. Usou o seu tempo durante o governo de Sócrates para consolidar a posição e ir tecendo a teia. Andou por sedes e salas, comeu e bebericou, terá eventualmente conspirado, distribuído sorrisos e favores, e não há-de ter sido fácil a cavaqueira, mas o propósito motivava-o. Como secretário-geral o processo estava completo, bastava fingir de morto e calar os ímpetos, que o lugar de primeiro seria seu, e se lhe caísse antes no colo melhor. Afinal um homem inteligente trabalha apenas o necessário para alcançar os objectivos definidos. O que fizer a mais é desperdício. Seguro podia ter trabalhado estes três anos para se tornar uma pessoa melhor. Mas não era necessário.
Em pânico, Seguro considerou as hipóteses que tinha e entre outros ridículos rodopios, tirou da cartola umas primárias que antes defendera serem perniciosas. Não contente, desata a acusar Costa de traição, quando antes, muitos anos antes, fora ele o primeiro a trair Costa. Ainda não satisfeito, declara que se andou a esconder e que na verdade culpava Sócrates da situação que deixara a Coelho. Entre tremores e quase lágrimas que lhe valeram o epíteto de Calimero, ainda se lembrou de culpar Marinho e Pinto pela finalmente assumida vitória insuficiente, e para o resolver, renegando palavras próprias anteriores, saca da ideia da redução do número de deputados e embrulha-a numa suposta proposta de deliberação, cujo único efeito será fazer gastar tinta aos jornais.
Mas o pânico tem destas coisas, é uma emoção primária, sobrepõe-se a qualquer embuste. Seguro vinha-se mostrando preguiçoso, sonso, ingénuo, mesmo fraco, mas sempre suscitando a suspeita. Aquele tipo de cara simpática em que a gente não acredita sem saber muito bem porquê, mas que por parecer inofensiva vamos dando o desconto, por receio da injustiça de um preconceito eventualmente infundado.
Em pânico Seguro revelou-se em todo o seu esplendor. Há-de haver quem goste. Pessoalmente, já temos uma democracia suficientemente madura, já experimentámos amiúde, já os vimos passar por aí e ainda lá restam alguns, não vale a pena.
Nestas eleições primárias, onde António José Seguro me dá a oportunidade de me pronunciar, oportunidade essa que não agradeço, seja pelo empatar que representa seja pela falta de qualidade da organização, eu vou votar, não pelo PS mas o que vai dar no mesmo, pelo meu país.
Com a idade que tem, Seguro não vai mudar. Por Portugal e pelos meus concidadãos, basta de gente que nos envergonha. Por tudo isto, e muito mais, dia 28 de Setembro lá estarei, para votar António Costa.
Nota: Este autor não utiliza o novo acordo ortográfico.